terça-feira, 28 de setembro de 2010

ODUN ADORIN DE PAI AIR DE OXOGUIÃ

No dia 20 de setembro deste ano completou 70 anos de vida o Babalorixá Air José Sousa de Jesus, de quem recebeu o nome carinhoso de sua Iyalorixá e tia consangüínea Caetana Sowzer, de Aizinho. Pai Air como é conhecido pelas pessoas é filho de Tertuliana Sousa de Jesus e neto de Felisberto Sowzer, último Babalawo que a cidade de Salvador teve notícias. Benzinho como era conhecido era homem letrado, falava fluentemente inglês e nas suas viagens feitas, sobretudo ao Rio de Janeiro iniciou várias pessoas. Todavia, a sua maior contribuição para as religiões de matriz africana no Brasil foi a sistematização do método advinhatório chamado Bara ou Merindilogum. Como filho de Ogun, Benzinho reuniu dezesseis caminhos chamados Odus com suas respectivas histórias e preparou cadernos posteriormente divulgados ora desconhecendo ou ignorando a sua participação nos mesmos. Felizberto Souwzer era filho de Julia Martins Andrade, tia Júlia, filha consangüínea de Rodolpho Martins Andrade, Bangboxe Obiticô, o jovem trazido por uma das sacerdotisas que estava à frente do Candomblé do Engenho Velho para ajudar a sistematização do culto a Xangô. Tio Bangboxe participou da iniciação de Eugênia Anna dos Santos, mãe Aninha que em 1910 criou o Ilê Axe Opo Afonjá, hoje centenário. Acredita-se também que o Tio Bangboxe também esteve presente na ocasião da estruturação do Sítio do Pai Adão em Pernambuco. Pai Air é assim, herdeiro da tradição de sua família, da extensa família de Xangô entrada no Brasil com os primeiros yorubás chegados entre final do século XVIII e meados do século XIX vindos do reino de Oyó recém destruído pelos povos vizinhos. Pai Air desde cedo sentiu essa responsabilidade. Iniciado ainda quando criança por três mulheres de Oxun, fato que lembra com orgulho, começou desde cedo acompanhar à sua tia e Iyalorixá, Mãe Caetana. Em 1961 no alto do Caxundé, atual bairro da Boca do Rio, sobre uma duna, quando na região havia apenas poucas casas de taipa cobertas com folhas de coqueiro ou de zinco,Pai Air com apenas 21 anos de idade concretizou um sonho que completará no próximo ano, cinqüenta anos: o Ilê Odô Ogê. Uma casa dedicada a Oxoguian, ancestral a quem foi consagrado, à Oxun e a Xangô. De patrimônio arquitetônico, artístico, histórico e imaterial inquestionável, o Terreiro Pilão de Prata, como é conhecido, foi tombado pelo Instituto de Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) no ano de 2004. Além de um acervo bibliográfico sobre as religiões de matriz africana, a casa com recursos próprios mantém um Memorial e instalações prontas para serem implantadas oficinas voltadas à comunidade. Foi o primeiro terreiro instalar o bosque sagrado, um espaço onde se cultiva algumas plantas rituais que estão em estágio de desaparecimento. Considerado sempre a frente de seu tempo Pai Air é sempre reportado pelo seu bom gosto, requinte, estilo, amor e carinho com que trata os Orixás que sempre quando se refere, faz questão de lembrar: “os Orixás são a minha vida.” Pai Air é um homem extremamente metódico, acompanhá-lo exige disciplina. É também um homem de poucas palavras, de passos firmes, mas silenciosos, razão pela qual está sempre surpreendendo, até quando se coloca alguém para vigiá-lo. Esse é um dos principais motivos que dificilmente seus filhos conseguem organizar festas surpresas. Pai Air, não obstante o seu significado para as religiões de matriz africana no Brasil é muito simples. Varias vezes ouvi afirmar: se a pessoa chega até aqui ela não pode sair sem ouvir uma palavra. Quanto a outras tradições religiosas, Pai Air sempre lembra: não conheço candomblé, o que sei é aquilo que Mãe Caetana me ensinou. Com os ensinamentos de sua Mãe de quem nunca se separou, Pai Air segue dizendo: “Orixá para mim é a água que eu bebo, o ar que eu respiro e os olhos que eu enxergo.” Oxun para mim é tudo. Ela é a minha maior riqueza. Este ano, as comemorações do seu aniversário foram também modestas. Pai Air recebeu telefonemas e agradeceu aos orixás pela extensa família de santo e amigos que conseguiu acumular durante estes anos, anos de todos os dias dedicados aos Orixás. Isso porque ele sabe que a cada ano que se dobra, a responsabilidade aumenta, agora ele cuida do mundo como Oxoguian e Oxun que toma conta de nós como a galinha protege os pintinhos debaixo de suas asas. E para que melhor presente do que ter o mundo todo desejando que Iyemanjá transforme os anos que virão em algo incontável como as areias da praia? Acredito que esse é o desejo de todos e todas que compõem as extensas famílias do terreiro do Luis Anselmo fundado por Tia Júlia atualmente sobre a liderança de Tia Irenea Sowzer; do candomblé do Engenho Velho; da casa de Mãe Caetana, chamada Lajuomim e do terreiro Pilão de Prata, casa fundada sobre a proteção do Orixá que desde os primórdios tomou para si a responsabilidade de cuidar do mundo.

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Quem sou eu

Salvador, Bahia, Brazil
Antropólogo, Doutor em Ciênciais Sociais pela PUC-SP e Pós Doutor em Antropologia pela UNESP. Membro do Centro Atabaque de Cultura Negra e Teologia, Grupo de reflexão inter-disciplinar sobre Teologia e cultura fundado no início dos anos 90 em São Paulo.Professor da Escola de Nutrição da UFBA, autor de vários livros na área de Antropologia das Populações Afro-Brasileiras.